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A humanidade entrou em refundição, nestes últimos anos, e converteu-se em valores. O homem já não é animal bípede implume, nem rei da criação, nem homem: é moeda. O que por ora lhe não fazem é tocá-lo sobre um balcão a ver se ele tine bem, e dá os quilates legais; mas, com o decurso dos descobrimentos, há-de inventar-se um qualquer instrumento, mediante o qual se determine rigorosamente as libras que cada pessoa tem na algibeira e as que deixou em casa. Este instrumento há-de dispensar a boa-fé necessária nos contratos, a probidade comercial, e as custosas informações que se tiram dos sujeitos de «fortuna» equívoca.
Nesses futuros próximos e auspiciosos dias, que eu tenho a honra e glória de profetizar ao género humano, os pais de meninas desposáveis não hão-de ser enganados pelos genros, nem os genros pelos sogros; o capitalista saberá, a ponto, se o aceitante da letra está endinheirado na véspera do vencimento; a prima-dona observará de antemão se o empresário premedita caloteá-la na melhor boa-fé de empresário insolvente. É um sem número de vantagens sociais a promanarem da invenção do instrumento, que poderá chamar-se numímetro, de numus, «dinheiro», e metron, «medida».
Tudo nos anuncia o próximo aparecimento do numímetro.
É preciso que se invente alguma cousa que supra a falta de lealdade nos contratos, a qual se há-de ir quebrantando, à medida que a religião, forja onde se caldeiam e depuram as consciências, se for desluzindo.
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In "Vinte Horas de Liteira" - C.C.B.
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