Manoel de Oliveira apresenta o seu filme: "O Dia do Desespero"
24 de Setembro de 2010, no Auditório do Centro de Estudos Camilianos, em Seide.
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“Eu estou aqui a falar, mas não sabem quem eu sou. Eu sou o Manoel de Oliveira”: a apresentação estava feita perante uma plateia lotada que escolheu passar a sexta-feira à noite na companhia do cineasta. O pretexto era o regresso de Manoel de Oliveira à Casa de Camilo, em Vila Nova de Famalicão, quase vinte anos depois da estreia do filme “O Dia do Desespero”, que relata a história verídica dos últimos anos de vida do romancista Camilo Castelo Branco. O Centro de Estudos Camilianos emprestou o seu auditório para rever “O Dia do Desespero”, com a promessa de ouvir o mestre recordar e rever os pormenores das filmagens – e os famalicenses não faltaram à chamada.
Em passo apressado, o realizador que em Dezembro cumprirá 102 anos, entrou numa sala cheia. À porta, quem não conseguiu entrar espreitava, tentava vislumbrar a silhueta do mestre. E este fez ecoar os mais sinceros agradecimentos e apresentou-se, poupando palavras ao seu interlocutor, que tinha acabado de perguntar: “Como apresentar quem não precisa de apresentações?”
Manoel de Oliveira descobriu o fascínio por Camilo Castelo Branco, revelado tanto em “O Dia do Desespero”, como nas suas obras “Amor de Perdição” e “Francisca”, porque, tendo sido “um escritor excepcional” é impossível não o descobrir. “Quem é que não o descobriu? O fascínio é evidente”, atirou num tom bem-humorado que manteve, tanto na conversa prévia à exibição do filme, como na demorada sessão de perguntas posterior, levando a plateia inúmeras vezes às gargalhadas.
Sobre os pormenores da rodagem de “O Dia do Desespero”, filmado em 1991 e projectado no Centro de Estudos Camilianos de Vila Nova de Famalicão, o realizador reconheceu não se lembrar de histórias particulares, nem daquela em que terá pedido folhas, importadas da Bélgica, para uma acácia despida. O tom bem-disposto foi pontuado por momentos sérios, especialmente quando o tema era Camilo Castelo Branco. “A vida dele foi funesta”, assegurou o realizador, que vê na figura do escritor o peso de uma “perseguição” de que foi alvo desde criança.
O homem que já foi “muita coisa”, mas agora é só realizador, intercalou o tema camiliano com outro: a morte. “A morte igualiza toda a gente. Ricos e pobres”, afirmou, debruçando-se depois perante a relação que se estabelece entre o seu oposto, a vida, e o cinema.
Para Manoel de Oliveira, “a própria vida não tem nada de original”. “Foi o viver que me ajudou a fazer cinema e não o contrário. O cinema copia o que o Criador cria, portanto não me podem chamar criado”, resumiu.
Apesar de não ser presença habitual nas salas de cinema, o cineasta que começou quando o cinema ainda era mudo – “Fiz cinema mudo, porque não havia som”, disse –, não se escusou a comentar a nova revolução tecnológica pela qual a sétima arte está a atravessar. “Acho que as três dimensões são de mais, porque exageram a própria vida. Por mais voltas que dêem à técnica, nunca a técnica substitui os seres humanos”, defendeu o realizador mais velho do mundo ainda em actividade.
Fonte: AGÊNCIA LUSA, 25-09-2010
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